quinta-feira, 31 de julho de 2008

'Cause every little thing...

Carter nunca foi fã de rotina. Por mais que sua vida pareça uma, ele procura sempre fugir dessa definição ao analisá-la sempre de um ponto de vista diferente. Fazer isso o engana. O faz achar que sua vida é sempre um mistério pronto para ser desvendado.
Quem dera fosse verdade. Carter sempre se imaginou sendo um daqueles detetives dos filmes policiais antigos. Digamos que, em sua mente, ele tem as habilidades intelectuais de Sherlock Holmes e a capacidade física do espião Ethan Hunt.
Sua vida é o cenário do crime. A sociedade possui, ao mesmo tempo, os criminosos e os inocentes, as vítimas e os culpados, o bem e o mal. Quanto a isso, acho que ele não está sonhando tanto, não é?
As ações negativas cometidas pela maioria podem ser consideradas o crime a ser investigado.
Os que tentam diminuir os prejuízos das mesmas, podem ser considerados os coadjuvantes do bem.
A investigação começa quando Carter entende o que algumas pessoas pensam. Quando ele procura entendê-las. O que as leva a agir tão variavelmente? O que as leva a cometer crimes escandalosos como o que aconteceu essa semana, quando uma garota foi esquartejada, colocada em duas malas e jogada em um rio?
O que leva alguém a arremessar uma criança da janela de seu apartamento?
O que leva pessoas que já têm tudo na vida a roubarem tanto dinheiro como no caso dos políticos presos a algumas semanas ?
Carter imagina que cada uma dessas pessoas têm um motivo em especial para cometer tais ações. Apesar da diferença de casos, há um certo elo entre todos eles: o egoísmo.
Ao esquartejar a moça, o rapaz não queria deixá-la contar para sua família que ele usava drogas. Pensou em si mesmo, e só nisso. Uma garota linda, com toda uma vida pela frente. O egoísmo chegou ao seu ápice quando colocou à prova a sanidade mental daquela pessoa.
Ao jogar a garota da janela de seu apartamento, seu pai pensou apenas em como fantasiar uma história plausível para que os policiais não o acusassem de ter espancado a mesma. Ao pensar só nisso, ele esqueceu que tinha em mãos a vida de uma criança.
Ao desviar milhões em verbas, lavar, e deixar de pagar os impostos que normalmente seriam atribuídos a ele, o tal político mostrou para o país e o mundo que o egoísmo possui diferentes formas de agir.
Todos os crimes descritos acima têm o mesmo nível de mistérios e clareza um do outro.
Entendemos que a corrupção, o assassinato e a mentira são frutos de um sentimento que deveria ser mais estudado por todos.
O tal egoísmo leva a atitudes extremas, fazendo com que os indivíduos que as cometem demonstrem uma frieza calculista quando questionados sobre o motivo de tais acontecimentos.
Um diz que matou e não se arrepende.
O outro diz que não foi ele que cometeu.
O terceiro sabe que fez, mas sorri por saber que vai se dar bem.
É uma equação simples que só prejudica o nosso país.
Carter tem o sonho de morar fora um dia, mas esse sonho não é maior do que o de ver o país que ele reside fazendo juz à frase que carrega em sua bandeira.
Como sempre foi fã de Bob Marley, ele finaliza sua rápida investigação da mente humana, utilizando uma das histórias mais exemplares já protagonizadas pelo rei.
Ao ser questionado pelo motivo de ainda querer fazer um show, dias após sofrer um atentado, quando levou alguns tiros, Bob responde:
"Se todas as pessoas que tentam fazer desse mundo um lugar pior não descansam um dia, porque eu descansaria?"
A sociedade prepara o crime. O criminoso o comete. Talvez a única forma de melhorar tudo isso é olhar para dentro de nós mesmos e perguntar: "Onde estou errando?"

quarta-feira, 30 de julho de 2008

Sentimento Sem Fim

Ontem à noite, Carter resolveu assistir a um filme que, com certeza, a maioria dos apaixonados por cinema deve conhecer. Trata-se de "História sem fim". Antigo, não? Mas com um charme que só filmes que marcaram época possuem.
Depois de reviver momentos de sua infância, ele ficou imaginando como seria bom poder ter um livro daquele. Poder fazer parte das histórias que ele conta. Poder ter um amigo como Fuchur e sair voando por aí. Pousar no alto de uma montanha e descansar, olhando toda a paisagem.
O melhor de escrever uma redação é isso. Poder participar como observador ativo das histórias que são escritas. A idéia do filme é tão fantástica para ele que, mesmo depois de tanto tempo, ela se mantém atual em sua memória.
Bastian Balthazar pode ser qualquer um que lê um livro e lembra de sua história mesmo depois de algum tempo. Pode ser uma pessoa que aprende os ensinamentos dados por um escritor que sabe usar sua imaginação. Pode ser uma pessoa que apenas viaja com os cenários descritos pelo mesmo, e se imagina sendo aquele personagem ali descrito.
Carter fica impressionado com a habilidade do autor daquela história, pois sabe o que ele fazia quando escreveu aquilo tudo. Ele apenas parou para ouvir sua imaginação. A criatividade é fruto dessa atitude. Parar e ouvir a si mesmo, sem forçar nada. Você não cria nada forçando e dizendo "Anda, inventa algo, inventa". Todas as maiores criações já concebidas pela humanidade surgiram de momentos em que o criador percebeu detalhes que o inspiraram, como Einstein com seus estudos sobre a gravidade após ver uma maçã caindo de uma árvore.
O talento vem da capacidade de perceber detalhes que todos deveriam possuir. Caso não possuam, ao menos devem tentar melhorar e qualificar sua percepção.
A idéia que o filme traz é exatamente essa: o uso da imaginação como fator de potencialização da criatividade que todos possuímos. Ele o fez. E concebeu uma história de fantasia que nos causa uma nostalgia extrema, quando a revemos e percebemos o passado glorioso que temos em mãos.
O melhor é saber, de acordo com Carter, que, ao sentir essa sensação maravilhosa, notamos a presença daquela parte infantil que todas as almas possuem, mas que muitos corpos não demonstram.
Carter se via como um garotinho assistindo às cenas interpretadas por Bastian e Fuchur, imaginando como seria viver aquela realidade, participar daqueles momentos de aventura e fantasia. Talvez ele concorde que seja apenas um modo de esquecer a realidade que somos forçados a viver, aproveitando cada segundo das realidades que temos o previlégio de escolher.
Experimentar reviver momentos que nos faziam sorrir quando éramos pequenos é dar valor à nossa personalidade, dar valor a quem somos, pois não começamos a construir uma casa pelo teto. Ter uma base que nos causa nostalgia, que de acordo com Carter é um sentimento bom, é saber que o nosso futuro será construído em cima de vigas e paredes firmes.
E a quarta-feira se inicia com aquele leve e importante sentimento de nostalgia que deveria ser levado em consideração por mais pessoas.

terça-feira, 29 de julho de 2008

O Conto de Narciso

Terça-feira. Um dia meio parado. Pelo menos para o nosso complexo protagonista. Como sempre, ele sai para sua caminhada de manhã, observando a expressão das pessoas que cruzam seu caminho. Em cada uma ele percebe algo de intrigante. Existem aquelas que deixam escrito em suas testas que fazem aquilo por "livre e espontânea pressão". Existem aquelas que fazem aquilo apenas para acompanhar alguém que é importante em suas vidas. Mas em sua grande maioria, existem aquelas que procuram saúde, se importando quase sempre com a estética que, inegavelmente, é uma das maiores buscas da humanidade.
Quem nunca ficou parado em frente ao espelho durante horas, se arrumando para alguma festa, algum encontro? Diz a crença popular que os homens são mais diretos, mais rápidos. Mas o que dizer dos tais metrosexuais? Todo homem tem um pouco das características de um sujeito que cultiva essa rotina.
As mulheres, por sua vez, dão muito mais atenção a esse requisito. Lindas, elas sempre deixam marmanjos babando quando capricham no visual. Não é para menos, hoje a beleza é um dos fatores que mais influenciam na vida pessoal e profissional de uma pessoa. Ela irá carregar a imagem da empresa para quem ela vai trabalhar.
Olhando toda essa evolução estética, talvez tenhamos analisado superficialmente as coisas. Carter já conheceu tantas pessoas que pareciam espetaculares mas, ao abrir a boca, mostravam de onde vieram. A tal beleza interior pode parecer meio piegas, mas é essencial.
O preconceito possui, como uma de suas vítimas, pessoas que vivem pessoalmente e profissionalmente para a beleza. Modelos são alvos fáceis. Artistas também. É preciso conhecer essas pessoas a fundo para que paremos de pensar que se trata de "mais um rosto bonitinho".
O interesse de Carter em pessoas com conteúdo parte desse princípio. Todos podem dizer que uma determinada mulher é bela. Mas poucos deveriam ter o direito de dizer que ela é linda. Tratam-se de pessoas que, ao conversarem com ela, a fazem mostrar quem realmente é. A fazem querer ser alguém além da estética.
Pela parte dos homens o assunto é mais complicado. O mundo é consumista. O status de uma pessoa conta mais que sua personalidade. Um homem deseja ter todas tendo tudo. São raros os casos em que percebemos que existe algo de interessante em determinados relacionamentos.
Carter conhece alguns que realmente merecem ser aplaudidos de pé. Um deles em especial. Trata-se de um namoro que já dura 3 anos, onde a garota é linda (Carter a conhece muito bem) e o rapaz não pode ser considerado um ícone da beleza, mas trata-se de uma pessoa muito boa, o que eleva o seu status. O namoro dos dois sempre foi considerado, por Carter, uma história de cinema. Se conheceram de uma forma fantástica. Ela estava atravessando a rua, conversando com uma amiga e ele, que adorava andar de skate, vinha descendo pelo mesmo caminho. Por distração dele ou capricho do destino, ele não diminuiu a velocidade, fez a curva e se chocou com...adivinhem? Isso mesmo, ela.
Caíram e ele rapidamente se levantou, correu para ver se ela estava bem. Ela disse que sim. Ele perguntou se ela queria companhia para ir ao hospital. Ela disse que não precisava. Mesmo assim ele insistiu e pegou o telefone dela, caso algo fosse necessário.
A partir desse dia, claro, ele não parou de ligar. Ela que havia gostado da atenção que ele dedicou à ela naquele dia, já havia sentido algo de diferente nele (vide beleza interior).
Os dois começam a namorar depois de um tempo. A família dele não a aceitava. A dela desconfiava do galanteador metido a super-herói. Os dois ficavam indiferentes a isso.
O namoro fica mais sério. Os dois se encontram todo fim-de-semana. Ela diz que odeia ter que ficar ouvindo a família resmungar sobre o tal relacionamento, encontrando um refúgio ao lado dele. Ele, como pessoa boa que é, ouve a mãe calado, ajudando-a nos afazeres de casa, trabalhando e, nos finais-de-semana, indo conviver com a razão de sua alegria.
Ele consegue criar um negócio que faz sua vida melhorar bastante. O tempo passa.
Os dois sentem a felicidade em seu ápice.
Mas, infelizmente, ele é obrigado a fechar seu empreendimento, pois seus rendimentos já não eram suficientes para mantê-lo vivo.
Ela termina os estudos e vai ajudá-lo a procurar emprego. Mas infelizmente, ele não consegue encontrar nada que possa sustentá-lo, pois ele precisa de um local para morar, além de arcar com todas as suas despesas. Sua mãe havia deixado-o na cidade a algum tempo, sem nada.
E então surge uma oportunidade de conseguir uma estabilidade. Mas tudo tem seu preço. Tratava-se de uma viagem para o exterior, onde ele trabalharia e residiria. A reação dela já era previsível.
Ele embarca e ela mal consegue respirar. Seu choro é de partir qualquer frieza, gelar qualquer alma e entristecer qualquer sorriso.
Os dias se passam. Sua solidão aumenta a cada flash dos dias que passavam juntos. Ele tenta ligar, mas nunca consegue ouvir a voz dela direito. Ela faz, na parede do seu quarto, uma contagem regressiva, onde todos os dias ela risca o número anterior e escreve a quantidade restante.
Carter ouve suas palavras de dor, de sofrimento. Não sabe o que dizer, pois nunca sentiu algo tão forte por alguém.
Mas a vida havia reservado algo a mais para os dois. Alguns meses e lágrimas depois, ela se encontra sentada no sofá, olhando algumas fotos de seu skatista favorito. De repente, escuta algumas batidas em sua porta. Se levanta para ir atender e dá de cara com ele, ensopado pela chuva que caía, com um sorriso que a ilumina quase que imediatamente. Ela, sem dizer uma palavra sequer, voa para os braços dele, apertando-o forte e imaginando que aqueles dias haviam sido os piores de sua vida. Ele, quase que telepaticamente, diz: "Idem meu amor, idem."
Depois de algum tempo sem pronunciar letra alguma, ela se senta, juntamente com ele, e pergunta o que havia acontecido. Ele diz que chegando ao seu destino, foi impedido de entrar no tal país, pois todo o esquema que amigos de sua mãe haviam arranjado para ele era ilegal.
Ele confessa que já sabia disso, mas o desespero para dar uma vida melhor para ela era maior que qualquer medo de não dar certo.
Sua moto, que ele havia trabalhado tanto para comprar, foi o que gerou o dinheiro da viagem, naquele momento, perdido de uma só vez. Mas ele não considerava aquilo um prejuízo, pois nesse dia ele percebeu que o que ele tem de mais importante estava todo o tempo ao seu lado e se ele tinha que lutar por um futuro, teria que ser ao lado dela. Nunca esteve tão certo.
A verdadeira beleza é essa. A vida nos impondo desafios e nos retribuindo com conquistas, que, como no caso dos dois, se resumiam na garota que estava ali, junto dele.
Logo depois ele viajou para um estado brasileiro e conseguiu algum dinheiro, mesmo que pra isso, foi obrigado a ficar alguns meses longe da pessoa que ele mais ama. Não que isso tenha sido complicado como a experiência anterior. Dessa vez os dois se falavam todos os dias, por telefone, internet e cartas. Era como se estivessem lado a lado, tendo a certeza de que o tempo de espera para o reencontro era infinitamente menor.
De acordo com Carter, atualmente, os dois trabalham e têm uma vida estabilizada e cheia desse sentimento que ainda é uma incógnita para ele. Mas ao menos, depois de conhecer a história desses dois, ele sabe que é algo que todos devem experimentar um dia.
Se a humanidade não entender que a verdadeira beleza se encontra nas atitudes e na fé de cada um de nós, talvez um dia nos veremos parados em frente ao espelho, imóveis, tentando entender o que nos levou a vestir aquela máscara de perfeição. E, cedo ou tarde, chegaremos à conclusão de que fizemos isso para tapar os buracos de nossa alma.

segunda-feira, 28 de julho de 2008

Prazer Anunciado

Eles se encontram. O abraço combinado dias antes acontece de uma forma que parecia não ter sido desenhada préviamente. A respiração da garota fica alternada entre ofegante, e aliviada. Ofegante por perceber que teu corpo não quer sair dali. Aliviada por saber que sua mente compartilha a mesma vontade. Ele imagina como mantê-la ali, estasiada, sem esquecer que precisa deixá-la respirar para que possa analisar e perceber que aquilo que acabara de acontecer foi maravilhoso.
E ele o faz. Ela o olha profundamente. Ele retribui.
Os dois haviam combinado de se encontrar para descarregar aquela vontade acumulada no decorrer de suas conversas por telefone e pela internet. O engraçado é que os dois costumavam descrever a cena do dia H. Como ela reagiria, o que ele faria. Detalhes que só fazem enriquecer o momento em sua prática.
Os dois, que antes só se conheciam por sons e imagens imóveis, agora se vêem ali, livres para sentirem o olhar, a respiração, o toque um do outro.
Não perdem tempo. O beijo vem sem aviso. Os olhos dela se fecham e deixam que a mente idealize a sensação e a reação oposta. O abraço tenta torná-los uma pessoa só.
O desejo dela aumenta cada vez mais. Os dois percebem que chega o horário de assistirem o filme escolhido como "Mc Guffin" para o encontro dos dois. Eles dão uma pausa, respiram, soltam aquele sorriso do tipo "Nossa, quase perdemos a noção do tempo".
Se sentam no canto da sala. O filme começa. Mas, como era de se esperar, os dois decidem fazer sua própria arte. A boca da garota pede para que a dele a toque. O beijo volta a arrepiar ambos.
Ele beija seu pescoço, atitude que a deixa, como ela gosta de dizer, flutuando.
O prazer que ele sente vem da certeza de que ela está sentindo prazer.
Ela não nega que ele conseguiu alcançar esse objetivo.
O beijo se torna envolvente. Ela sente aquele frio na barriga que sobe à medida em que ele demonstra mais ainda a sua vontade de estar ali, fazendo aquilo. Ela tenta dizer alguma coisa, mas sempre decide, de última hora, respirar fundo e curtir mais um pouco aquilo tudo. Quando finalmente ele deixa seu pescoço respirar um pouco, suas palavras são silenciadas por um novo beijo, que, agora, envolve seus lábios, fazendo-a suar de desejo.
Se os perguntassem como é o tal filme, eles responderiam: "É bom". Apenas isso. Sem dizer que estavam se referindo à cena que protagonizaram intimimamente.
Ela adora morder os lábios do rapaz. Ele adora retribuir esse favor.
Ela o toca, o arranha. Ele sente a dor, mas não reclama. Mostra que o beijo da garota realmente surpreendeu suas expectativas. Sente que o seu fez a mesma coisa por ela.
O tempo passa. Eles se abraçam e tentam acompanhar a história do filme. Mas confessam não estarem interessados no mesmo.
Infelizmente, o prazer tem horário marcado para acabar. Eles se dirigem à saída sorrindo. O rapaz pergunta: "Aproveitaram bastante o filme, pessoal?". Ambos, em coro, dizem: "E poderia ser diferente?".
Cada um se dirige à sua casa imaginando como aquilo havia sido bom.
Um beijo não é apenas uma palavra que nos lembra algo bom. Um beijo é o início de tudo. É a gota d'água para que o desejo tome conta de dois corpos. Com língua, sem, apenas um selinho. Não importa.
Esse sempre será o símbolo dos apaixonados, dos amantes, dos escravos do desejo.
Caótico e maravilhoso. Em suas variadas formas, o beijo é a fusão de dois corpos, e Carter compartilha dessa mesma opinião, pois ficou maravilhado em saber que mais alguém sabe descrever as sensações que um belo e atraente beijo trazem.
Afinal, quem não concorda que essa é a rotina do mesmo?

sexta-feira, 25 de julho de 2008

Imprevisível

Véspera de fim-de-semana. Carter pensa no que fazer para aproveitar os próximos dias da melhor maneira possível. Não quer ficar parado, esperando que alguém o chame para fazer algo. Isso nunca dá certo. Sempre o chamam de última hora, dizendo que acabaram de pensar em algum programa. Claro que é apenas um pretexto para não chamá-lo sem ficar com peso na consciência. Ao menos, ele acredita nisso.
A semana foi boa. Ele consegue escrever sobre algumas características de sua personalidade, divulgando-as a quem quiser entendê-las. Durante os dias que passou tendo esse como seu principal objetivo, Carter percebeu que isso o animou bastante, pois mesmo que poquíssimas pessoas tenham lido, ele sente que esse número foi significativo, pois seu mundo já não é habitado por somente uma alma.
Sente falta da garota que o mostrou como isso é bom. Lembra-se do dia em que ela, com um sorriso maravilhoso, o convidou a conhecer o seu mundo. Carter descreve o momento em que ele não gostaria de estar em nenhum outro lugar, se não ali, assistindo-a e admirando-a.
Ela o pergunta se ele gosta de se fantasiar. Ele fica intrigado. Ela envia o convite para que ele aceite a conexão via Web Cam. Ele, sem pensar duas vezes, aceita. O rosto maravilhoso daquela garota, que parece possuir a mesma personalidade que ele, aparece. Seus olhos verdes são o destaque das imagens. Ele a responde que nunca experimentou se divertir daquela forma. Ela o envia fotos em que ela aparece fantasiada de vários personagens de histórias infantis. Desde bruxas a bonecas de pano. Ele abre um sorriso. Aquele mesmo sorriso que abria quando sua vó o surpreendia com festinhas de aniversário surpresas. Fica intrigado, mas sabia que a alma daquela garota ainda era a de uma criança. Novamente, ele diz que nunca havia feito aquilo, mas que, ao ver aquelas fotos, tinha acabado de sentir que era o que ele mais queria fazer no momento. Ela abre um sorriso. Logo em seguida, diz que vai pegar o material que usa para se maquiar e se fantasiar.
Volta com um alegria que o contagia com uma força divina. Ela diz: "Qual seu personagem favorito?"
Ele responde: "Aquele que consegue dizer tudo sem pronunciar nenhuma palavra".
Ela sorri, e começa a fazer o contorno em seus olhos. Os mesmos olhos que o conquistaram por sua alegria e, ao mesmo tempo, por sua solidão. Os mesmos olhos de alguém que havia encontrado ali, uma pessoa que a entendesse e que, por sua vez, a fizesse também tentar entender. Aqueles olhos verdes que naquele momento ganhavam uma nova personalidade.
Seu olhar, que já era profundo, fica ainda mais quando se encontra sobre uma forte sombra preta. Ela pergunta para ele se está ficando bom. Ele diz que está ficando imprevisível. E isso, em suas palavras, é uma coisa muito boa.
Seus olhos de esmeralda se fixam em um espelho, auxiliando-a em sua próxima tarefa. Sua pele, que já era frágil e suave, fica ainda mais quando ela desliza sua mão sobre seu rosto, espalhando claridade sobre o mesmo e escondendo-o de tudo que podia afetá-la naquele momento.
Seus lábios finos se encontram com a ponta de um lápis, que faz questão de tirá-los aquela cor rosada que os deixava hipnotizantes. Um tom escuro entra em cena. Cada vez mais intrigante ela se torna. Seu rosto ganha um tom misterioso. Um tom "Dark". Ele fica hipnotizado, enquanto ouve algumas músicas que ela havia o enviado.
Com o cabelo preso, ela o pergunta o que poderia fazer no rosto para que uma de suas característica entrasse em cena. Ele diz que ela poderia fazer uma lágrima. Ela sorri, e atende o pedido. Logo depois, ela desenha algumas cicatrizes, que o fazem lembrar da boneca Sally, de "O estranho mundo de Jack", filme que ele sempre adorou. Ela diz a mesma coisa.
Sua nova personalidade está formada. Uma garota misteriosa, intrigante. Ela solta seu cabelo e olha atentamente para a tela. Seu olhar se encontra com o dele. Algo ali estava em sintonia. Ele diz que não queria estar fazendo mais nada. Diz que queria apenas estar ali, conversando com ela.
Ela diz que aquela é a sua face de mistério.
Logo em seguida, lava o rosto, sorri e diz que a parte mais complicada é limpar a região dos olhos. Ele ri sozinho, enquanto a diz que ela não existe.
Aquela criança em corpo de mulher o deixa fascinado. O faz querer um dia poder ter essa alegria que ela tem ao encarar a vida. Sua face misteriosa é apenas uma de suas várias demonstrações de sentimentos.
Ela decide então mostrar uma outra face de sua personalidade.
Mas Carter decide deixar para descrevê-la assim que possuir palavras para isso.

Um ótimo fim-de-semana a todos.

quinta-feira, 24 de julho de 2008

"Upando" a Confiança

Carter sempre encontrou, na tecnologia, motivos para considerá-la uma de suas maiores aliadas. Conheceu pessoas, aprendeu com todas elas e fez com que suas idéias fossem apresentadas e, posteriormente, elogiadas ou criticadas.
Exemplos de espaços nela encontrados não faltam. Ele sempre observou a capacidade de cada um em esculpir relacionamentos duradouros e, também, a facilidade com que podem afetar negativamente os mesmos.
Nessa quinta-feira, durante sua caminhada, ficou pensando na definição que todos dão ao Orkut, um dos sites mais utilizados no Brasil. "Site de relacionamentos". Carter comparou experiências boas e que confirmam essa definição, e outras, não tão bem sucedidas, que põem em dúvida a mesma.
Pois bem, ele decide se aprofundar mais e relembrar de casos negativos, em que o tal "site de relacionamentos" foi parte fundamental para seus respectivos desfechos.
Carter decide utilizar as palavras da própria "vítima" do site:

Eu amava meu namorado. Sempre fiz de tudo por ele. Sem o relacionamento que nós havíamos cultivado, eu não poderia me considerar uma pessoa feliz. Nunca fomos fãs desse site. Mas mesmo assim, todos diziam que era interessante. Resolvemos participar.
Durante um bom tempo, curtíamos como qualquer um as oportunidades que o espaço oferecia.
Conhecíamos novas pessoas e fazíamos questão de divulgar nosso relacionamento, para que assim, todos soubessem que eu tinha um dono e vice-versa.
Certo dia, eu recebo um recado de uma mulher, aparentando em torno de 23 anos, dizendo que eu deveria ficar com os olhos mais abertos. Não entendi o porquê daquilo, mas fiquei com uma pulga atrás da orelha. Ela insiste. Diz: "Talvez devesse manter o seu relacionamento sobre rédias curtas!". Decidi, depois disso, conversar com meu namorado. Ele ficou assustado e disse que aquilo era apeas curtição de alguém. Minha desconfiança aumentava à medida em que ela mandava mais recados.
Confesso que me assustei comigo mesma. Depois de tantos anos de relacionamento, eu ficaria tão insegura?
Sim. Ficaria. Comecei a procurar indícios de uma possível traição. Ele continuava jurando de pés juntos que não havia nada de errado. Eu comecei a não olhá-lo do mesmo modo que antes.
Depois de algum tempo, o desespero chegou ao ponto de eu ter que vasculhar tudo ele havia postado, tudo que ele possuía dentro do site e ficar de olho em suas ligações. Ele já não era o mesmo. Me olhava de um modo tão angustiante e eu não percebia.
Mesmo assim meu ciúmes crescia, transbordando no dia em que a tal guria posta uma foto dele, dizendo que aquele era o amor dela.
Eu não me reconhecia mais. Disse tudo que não deveria dizer a uma pessoa que eu amava. Ele apenas olhou nos meus olhos e disse: "Eu só queria sua confiança."
Aquilo caiu como um balde de água fria na minha cabeça. Ficamos meses sem nos falar. Eu chorava todas as noites.
E então chega o dia em que fico sabendo que ele se mudou para outro estado. Conformada com o que havia acontecido, eu decido continuar a investigação sobre quem era a tal pessoa.
Peço ajuda a amigos, parentes e tudo mais. E descubro que era apenas a ex-namorada dele, trocada por mim, o que deu início ao nosso relacionamento, e a fez se passar por alguém, visando acabar com o nosso namoro. Ela conseguiu. Novamente, me sinto impotente.
E pensar que tudo que ele queria era confiança.


Analisando a história acima, Carter fica pensando no que leva uma pessoa a acreditar, logo de primeira, no que alguém que ela nunca viu diz. Ok, o Orkut pode ser um ótimo lugar para fazermos amizades, e isso não deixa de ser um relacionamento, mas a intenção não bate com os resultados. E não por erro dos desenvolvedores. Mas por erros cometidos por nós mesmos.
Seria o caso de criarem um link que ficará em destaque no momento da criação da conta, que dirá: "Você tem namorado (a)?" "Se tiver, por favor, não participe!".
Quer fazer alguém se sentir traído? Deixe um recado dizendo: "Nossa, ontem a noite foi maravilhosa!", ou talvez: "Obrigado por ter me ligado. Te encontro no lugar marcado".
Carter só não espera chegar ao ponto de ter que mudar a definição para "Site Anti-relacionamentos".
A capacidade de acreditar na pessoa que está ali, do teu lado, parece que não exerce mais influência sobre as mentes dos apaixonados de plantão. Existem casos em que a traição é real? Claro que existem. Aos montes, por sinal. Mas mesmo assim, existem casais que não merecem ver o que não existe.
A influência exercida pelo site é tanta, que Carter não duvida que daqui a alguns anos, um namoro se caracterizá por acontecer da seguinte maneira:

- Posso fazer Login e interagir contigo?
- Claro. Digite sua senha e me deixe um recado, que retornarei em breve.
- Ok. Possui algum profile extra?
- Não não. Estou sozinha nesse aqui mesmo.
- Deixe-me lhe apresentar à minha comunidade "Olá, sou novo por aqui!"
- Ok, vou adicioná-la. É só você me aceitar.

- Nosso relacionamento não está indo bem. Vou apagar todas as fotos suas que estão no meu álbum. Por favor, não me mande mais depoimentos.
- Ok. Não o farei. Só quero que você entenda que depois que me excluir do seu networking, eu não irei adicioná-la mais!
- É assim? Então adeus! (Amigos -> João -> Delete.)
- Ela me excluiu? Será? Vou fazer um profile falso para espioná-la! Vai que outro Profile é o motivo do término do nosso namoro?!


Mais ambientado, impossível.
A tecnologia é apenas uma ferramenta. Não uma sentença.
Carter decide ligar para algumas pessoas, porque não existe nada melhor que ouvir a voz e sentir a respiração de alguém que você sabe estar ali realmente.

quarta-feira, 23 de julho de 2008

3º Dia de Outono

Quarta-feira. Mais um dia em que Carter procura acordar e fazer algo interessante, testemunhar algo interessante. Ele acorda, lava o rosto e vai se preparar para sua diária caminhada, que tanto gosta de fazer. Não pela saúde que ela proporciona, mas pelo momento de paz que ele ganha em quanto, de passo em passo, vai olhando todos os detalhes das paisagens, das pessoas que estão à sua volta. Isso o motiva a pensar em tudo que está vivendo. Isso é bom.
Ele veste uma calça, pois sente vergonha de mostrar suas canelas. Ele as acha muito finas. Coloca uma camiseta leve e, claro, pega um dos seus companheiros de luta: seu mp3. De música em música, ele caminha até o local que o acolhe todas as manhãs. 100 metros. Ele observa como o verde continua presente, mesmo quando a urbanização se torna, cada vez mais, uma coisa desenfreada. 200 metros. Ele percebe que se não fossem as árvores, a vida poderia não ser tão bela. Começa a olhá-las e compará-las ao ser humano. 500 metros. As árvores podem não demonstrar emoções, não demonstrar sinais do que pensam ou sentem. Talvez nós não saibamos reconhecer tais mensagens. O necessário não é o que elas poderiam fazer. É o que elas fazem.
Uma árvore possui um conjunto gigantesco de folhas. O que podemos considerar como sendo os seres humanos. O vento que bate nas mesmas pode ser considerado o destino de todas essas folhas. Às vezes ele é forte, consistente e, ao mesmo tempo, cruel. Toma rumos inesperados e acaba derrubando algumas folhas, fazendo com que as outras se assustem, mas ainda sim, as incentivando, para que continuem firmes durante o período de transformação que as testa. Quanto mais verdes, mais experientes. Quanto mais experientes, mais valiosas.
Mas não adianta experiência se não existe algo ou alguém que as guie, que as dê motivos para acreditar que a vitória é possível. Líderes são aqueles que agrupam as qualidades de um grupo, as expõe e as modela, fazendo com que os defeitos que o mesmo possua sejam apenas detalhes que, se bem esculpidos, transformam-se em exemplos para as próximas gerações. Aqui, os líderes são os troncos das árvores.
Eles sustentam as folhas, guiando-as, às vezes por caminhos tortos, mas sempre com o mesmo objetivo: chegar o mais alto possível. Não importa se seus galhos são podados. Ele resiste até o final, defendendo aquilo que o faz acreditar na vitória, o qual ele nasceu para defender. As folhas percebem que abaixo delas existe algo que as dá base, que as motiva ainda mais.
O tronco passa por todos os tipos de sofrimento. Vê seu corpo sendo mutilado. Mas não desiste.
As folhas percebem o esforço de seu líder, e decidem lutar pelo bem de todos.
Mas qual a motivação do tronco? O que podería fazê-lo se dedicar tanto a algo que ele nem precisava fazer?
Suas raízes. Essa é a resposta. Se elas forem fortes, um líder é lapidado. Se forem fracas, mais uma pessoa comum nasce, podendo acertar ou errar. Mas sem saber que essas duas opções são importantes.
A base do líder vem da sua criação. E é isso que ele tenta passar para as folhas.
Chuvas, ventanias. Não importa. Ele quer que as folhas resistam a todas essas tragédias.
Elas entendem o recado e, depois de muito trabalho em equipe, geram as flores e os frutos, considerados o ápice de suas vidas.
O tronco percebe que seu trabalho foi recompensado. O outono chega. O tempo é a dádiva mais cruel de todas. As folhas secam. A árvore fica mais triste. Seus galhos se recolhem, como se dissessem: "É chegada a hora".
Mas é aí que aparece um ser estranho. Sem casca. Sem folhas. Um ser que antes só pensava em derrubá-las, em mutilá-las. Esse ser poda um dos bons galhos que ainda restaram. A árvore fica intrigada, achando que se ele fosse derrubá-la, não seria de galho por galho. Ele tira uma muda, a coloca em um vaso e vai embora.
Dias depois, as folhas, que tanto trabalharam, finalmente descansam. O vento bate e derruba as últimas que haviam resistido. O tronco se vê sozinho, e percebe que se o trabalho de equipe foi a principal vitude do seu grupo, naquele momento, não poderia ser diferente. Em silêncio, ele joga suas armas no chão, torcendo para que o seu legado dure por muito tempo.
Mãos ferozes o derrubam. Enquanto se encontra caído, ele vê o ser humano que havia podado um de seus galhos. O mesmo abre um buraco, próximo ao local onde se encontrava a árvore e enterra parte da muda que havia obtido.
Desde esse dia, ele nunca mais deixou de ir até esse local. E a árvore que gerou esse fruto renasce. Nesse dia, ela percebe que o maior legado que poderia deixar é aquele que age diretamente na consciência dos seus próximos, fazendo-os ser melhores do que são.
12.000 metros. Carter sente que seu corpo pede para que ele descanse. A bateria de seu Mp3 acaba. Ele se despede do cenário que foi palco de sua reflexão, preparando-se para passar a mensagem aprendida adiante.

terça-feira, 22 de julho de 2008

O Impulso de Carter

Ele sempre foi um garoto misterioso. Gostava de ouvir histórias de outras pessoas, mas nunca de falar sobre as suas experiências. Ficava um pouco incomodado com isso, mas nada que o fizesse querer mudar. Achava que assim ele se tornaria mais interessante. Sempre foi muito sozinho, no que diz respeito a ter alguém com quem compartilhar seus sonhos, suas idéias.Alguém que viajasse com ele, que quisesse participar de suas fantasias. Amizades ele sempre teve. Porém só existem duas pessoas por quem ele bota a mão no fogo, se necessário. Durante toda a sua vida, buscou encontrar alguém que o entendesse. Não era tarefa fácil. Como conhecer alguém que se esconde sob uma couraça de segredos? O mais provável seria imaginar que ele não quisesse se abrir, mostrar quem realmente é. Mas ele sempre quiz. E é isso que o torna tão complexo.
Nunca conseguiu ter um relacionamento fixo. Apaixonado por mulheres, ele sempre fez questão de tratá-las bem. Elas sempre fizeram questão de esperar algo em troca. Mas ele nunca sentiu aquele desejo de se fixar a uma delas. Quando a relação ficava mais íntima, não fisicamente, mas espiritualmente, ele se fechava, e acaba as afastando. Talvez, consequência do medo de que elas estivessem sendo o problema.
Mas ele nunca se incomodou com isso. A sua busca continuava. Seu sonho sempre foi conhecer o mundo. Conhecer todas as culturas possíveis. Conhecer os pensamentos mais variados dos seres humanos. Entendê-los. Seu desejo se comparava àquilo que ele mais precisava: alguém que o entendesse.
Essa busca se tornava mais "fácil" pelo fato de que ele era apaixonado por tecnologia, e adorava a facilidade que a mesma proporcionava a ele, levando em consideração a capacidade de conhecer lugares, histórias e pessoas de todas as partes do mundo. Ela era sua aliada nessa busca.
Durante todo o tempo que passou lutando para alcançar esse objetivo, ele conheceu pessoas que o fizeram rir e chorar em frente ao monitor. Pessoas que tiveram a capacidade de o fazer acreditar que realmente sentia algo e que poderia ser um vestígio do ser humano com emoções que ele poderia ser nessa vida, ou que foi em vidas passadas. Pessoas que marcaram sua vida. Pessoas pelas quais ele realmente se importou.
Mas a vida jogou um balde de água fria em sua cabeça. As pessoas, por motivos variados, se afastaram, pois tinham objetivos diferentes, desejos e expectativas claramente antônimas às dele.
Ele novamente se fecha em sua esfera de mistérios. Continua aguardando o momento em que irá ser descrito com perfeição por alguém.
Mas então, chega o dia em que ele se encontra pasmo, arrepiado e ofegante em frente ao seu companheiro, fruto da evolução tecnológica da humanidade. O monitor reflete seus olhos cheios de lágrimas. Mas não lágrimas de tristeza. Era uma emoção que ele nunca havia sentido.
Tratava-se de uma garota que ele conhecia, ou achava que conhecia, a 3 anos. Ele já estava acostumado a ouvir as mesmas frases, do tipo: "Olá, tudo bem?", "Eu te amo!", "Eu te adoro!", e até gostava de ouvir, porém, sentia um vazio imenso quando constatava que aquilo estava sendo dito de forma autônoma, robótica.
Essa garota conseguiu surpreendê-lo. A conversa iniciou-se de uma forma excitante, pois ela descreveu o dia em que eles se falaram pela primeira vez, lembrando que já haviam se passado 3 anos. Ele a viu apenas uma vez, de longe, andando pela rua. Nunca conversou pessoalmente com ela. Ela, por sua vez, o via muitas vezes pela cidade em que eles moravam, mas nunca conversou com ele, talvez por medo de que ele não a reconhecesse.
Mesmo assim, ela conseguia prendê-lo à conversa. Até que chega o momento em que, ao se descrevar, a garota o faz tirar as mãos do teclado, passá-las sobre o rosto em uma atitude de espanto misturado com alegria. Ele percebe que ela está o descrevendo, sem saber.
Ela diz como se sente perante o seu perfil. Ela é misteriosa. Ela é enigmática. Ela é interessante. Características que sempre pertenceram a ele.
Ela diz que nunca conseguiu manter um relacionamento por muito tempo. Diz que busca alguém que consiga furar o seu casulo que, de acordo com seu ponto de vista, acha ser um tipo de defesa.
A cada palavra que salta de sua boca e que é transferida para o monitor, seu coração bate mais rápido, quase que como dizendo "Ela te conhece tão bem sem nunca ter te olhado nos olhos?"
A emoção aumenta quando ela conta quais são os seus maiores sonhos.
Ela não pretende se casar. Não pretende ter filhos. Quer ser livre, para que assim, possa conhecer o mundo, absorver cada ensimento que o mesmo possa oferecer. Os olhos dele esquecem que uma de suas funções é piscar. Ela continua e diz que gostaria de conhecer da África à Europa, da América do Sul à Ásia. Ele apenas balança a cabeça do outro lado.
Sem saber o que fazer para demonstrar o que está sentindo naquele momento, três palavras aparecem na tela da garota, dizendo: "Você me descreveu!"
Ela ri. Ele não sabe qual a reação real da garota. Ela diz que talvez ele não esteja tão sozinho. Talvez não seja apenas ele que se encontre nessa busca pela razão de sua existência.
Ele sente um alívio tão grande quando ela diz isso que chega a agradecê-la. Ela não entende, pois apenas se descreveu, mostrando seus sonhos, seus desejos. Mesmo assim, ele a diz que, naquele exato momento, alguém havia conseguido enxergar por trás da tal couraça que o revestia. Ela diz que já o conhece como se fossem conhecidos de infância. Ao não dizer nada, ele disse tudo à ela.
A garota, com um sorriso maravilhoso na foto que a representava, explica que também se sente como ele. Incompreendida. Ou ao menos, ninguém havia feito questão de compreendê-la.
Ele diz que ao perceber que ela possuía o seu perfil, a conhecia como ninguém, mesmo se ela não dissesse mais nenhuma palavra. Novamente ela ri, dizendo logo em seguida que o mistério que ele possui é o que o torna mais interessante ainda. Ele percebe que desde o começo estava certo. A conversa vai chegando ao fim. Ele percebe que o tempo não estava do seu lado. Ela envia músicas que o fazem achar, em suas letras, todas as pistas que indicam as características dela e, conseqüentemente, dele. O universo criado ali é fascinante. Ele percebe que não está sozinho. Percebe que pode compartilhar seu mundo, que pode encontrar pessoas como ela.

A conversa chega ao fim. Ela se despede e deixa um beijo. Ele retribui e, novamente, agradece pela conversa. Ela diz que ele não precisa agradecer. A verdade é que, naquela noite, haviam 4 pessoas ali. As duas que iniciaram a conversa, e as duas que a finalizaram.

Ele dorme com um turbilhão de pensamentos em sua mente. Acorda com todos esses pensamentos na ponta da língua.
Impulsivo, como sempre foi, ele decide compartilhar tudo que havia aprendido até ali, fazendo com que as pessoas o conhecessem e que, algumas delas, se identificassem com sua história, como a garota daquela noite.

E no impulso de contar essa história, quase ia me esquecendo. Muito prazer, Jimmy Carter.