domingo, 15 de fevereiro de 2009

Uma segunda chance, por favor

Uma sociedade de "ismos". É assim que Carter define o que hoje também pode ser definida como "a era do capital". É bem verdade que o dinheiro sempre falou mais alto quando levamos em consideração o desenvolvimento de um povo, mas, a partir do momento em que este começa a falar mais alto também em relação a atitudes importantes para um bom convívio, começa a ser necessária uma análise mais efetiva sobre seu poder sobre o ser humano. O capitalismo foi o único sobrevivente de sua família. É através dele que podemos considerar um país como sendo desenvolvido. Seus benefícios para a humanidade são claros. A questão é: seriam seus prejuízos tão facilmente enxergados por todos?
Analisando seu dia-a-dia, Carter percebe o quanto foram esquecidos os chamados gestos simples que, apesar do nome, possuem um poder de mudança extraordinário. Hoje, é mais válido levar vantagem (em muitas vezes, financeiramente falando) em tudo do que simplesmente deixar de ter um benefício imediato em prol do bem-estar de um próximo. É a famosa "lei de Gerson". Aplicando-se como uma forma de detrimento da sociedade, essa lei prima por colocar o capitalismo em destaque, transformado-o em um tipo de troféu para aqueles que se julgam superiores e que querem o retorno por suposta "classificação social" muitas vezes em forma de cifrões.
Aos poucos Carter entende de onde surgem as tais teorias conspiratórias. Todas as guerras, todos as revoluções tinham um quê de capitalismo encrostado em seus ideais. Generalização extrema? Carter acredita que trata-se apenas de um fruto gerado pela descrença de que um dia fomos ao menos 10% humanos.
Certo dia, ao assistir a uma reportagem na tv, ele ficou sabendo do caso em que, ao ganhar o prêmio de uma loteria, um rapaz havia achado que sua vida melhoraria por completo. E de fato melhorou. Ao menos se levarmos em consideração os bens materiais que ele adquiriu dali pra frente.
De brinde, apareceram milhares de pessoas que se diziam amigas, que diziam importarem-se com ele. Poucos tempo depois, ele aparece assassinado, em casa. A principal suspeita? A mulher com a qual ele havia acabado de se casar.
Claro, quem está de fora pode ter uma clara idéia de que as pessoas que apareceram em sua vida estavam apenas interessadas no dinheiro que acabara de ganhar, tendo sido ele ingênuo demais. Mas tentem analisar o caso tendo em vista o personagem principal da história. Ele era pobre, nunca teve um círculo social que, de acordo com os padrões cultos criados por uma sociedade materialista, pudesse ser chamado de nobre e nunca teve esperanças de tornar-se integrante de algum em toda a sua vida. Certo dia, ele fica rico e vê uma oportunidade de ter todas as suas ambições ali, na palma da mão. O instinto humano é primitivo em ocasiões como essa. O ser humano, ali, se torna previsível demais. Dificilmente ele pararia para pensar. Fazer isso seria perda de tempo para uma pessoa que sempre teve todo o tempo do mundo para lamentar-se.
Digno de culpa? Pelo contrário. O exemplo dado acima por Carter só mostra que o indivíduo é fruto da sociedade que o acolhe. Da mesma forma com que hoje uma garota diz não se interessar por dinheiro e logo depois deixa um rapaz que a amava para viver uma aventura com alguém que pode lhe oferecer todas as mais maravilhosas e fúteis coisas do mundo. Trata-se de instinto. Trata-se do sentimento de aproveitar a vida até a última gota.
É como um rapaz que sonha em ter um carro, em usar as roupas mais caras. Quem nunca sonhou com alguma dessas coisas? - pergunta Carter.
É uma característica que já está cravada na pela e na alma de todos os seres humanos. É o lema de julgar o livro pela capa, ou julgar alguém pelo que ela tem e não pelo que ela é. São conceitos repetidos em desenhos animados, em filmes "lição de moral", mas que estão ali para apenas mostrar que pelo menos a carapuça todos mostram tentar vestir. Eu disse tentar. Querer já é algo totalmente diferente.
Ajudar uma velhinha a atravessar a rua, oferecer um almoço digno para alguém que não pode tê-lo sempre, dar bom dia, boa tarde, boa noite. Atitudes mínimas. Atitudes valiosas que estão perdendo espaço para uma das atitudes mais previsíveis, desprezíveis e humanas que existem: olhar apenas para o próprio umbigo.
A ambição é necessária para quem quer sobreviver. Mas, como mães vivem dizendo aos seus filhos, até água em exagero faz mal. Carter só espera que, quando cairmos na real, percebamos que, apesar de fazer de tudo para afastá-las, ainda teremos pessoas que nos ajudarão a levantar sem esperar nada, absolutamente nada em troca.
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Carter a agradece pelo tema sugerido, Gaby.

quarta-feira, 4 de fevereiro de 2009

Personalidade Calculista

Se existem provas que confirmem que toda ação tem uma reação, Anne conheceu uma delas na última semana. Parte de uma família invejável, tinha um único defeito. Para poder dizer qual é, se faz necessária a apresentação de outra pessoa. Seu nome é Sam. Sendo a típica garota popular, Sam era o retrato da namorada ideal. Homens a olhavam, babando e torcendo para que ela desse algum sinal que alegasse algum tipo de atração por algum deles. Prima de Anne, nunca poupou esforços para manter sua família unida. Promovia festas, encontros e até quando não havia nada para se fazer, ela inventava. Tudo com o intuito de ver todas as pessoas que ama, ali, reunidas.
Mas essa qualidade era exatamente o fator fundamental para que o defeito citado acima entrasse em cena. Anne sempre teve vontade de ser como Sam. Seu corpo, suas coisas, seus amigos, enfim, tudo parecia se encaixar perfeitamente em sua ambição. Prova de que já havia passado dos limites há algum tempo se encontrava no desejo que ela sentia em fazer as mesmas coisas que Sam fazia com seu namorado, utilizando tais práticas em prol do seu próprio namoro.

A vida não poupava esforços para que essa inveja crescesse. Todos os rapazes com os quais ela se envolvia, se deixavam atrair por Sam, assim que a viam. Por sua vez, Sam sempre deixou bem claro que o seu caráter era o que ela possuía de mais valioso. Mas Anne não via isso com olhos tão bons assim.

Com o tempo, ela consegue mascarar essa característica, tornando-se, aparentemente, uma pessoa melhor. Mais controlada, Anne consegue reunir uma gama de amigos que realmente a curtem. Ao menos, para ela, já era algo a se comemorar, pois tratavam-se de amizades legítimas, pelo menos por parte de todos os tais amigos.

O tempo passa e Sam se enturma, fazendo com que Anne comece a se incomodar com sua presença. Com seu jeito meigo e, ao mesmo tempo, animado, Sam conquista grande parte dos amigos que faziam parte do círculo social de Anne. Claro que isso aconteceu naturalmente, pois Sam nunca fez com que eles se separassem dela. Pelo contrário, participava de todas as farras promovidas juntamente com sua prima. Todos felizes? Não. Aos poucos, Anne ía nutrindo uma raiva doentia, que a qualquer momento poderia vir à tona. Tal perigo acabou transformando-se em realidade.

Em um surto inexplicável, Anne e seu namorado, cujo caráter era extremamente duvidável, se unem, e tomam atitudes baixas para quem se julga tão moral como ela. Inventa histórias sobre a vida de Sam, dizendo que não era possível esperar juízo de uma pessoa que não se leva a sério, saindo e bebendo com os mais variados tipos de pessoas, ficando com vários ao mesmo tempo e abrindo sua vida como se esta fosse um livro. Quem as ouvia? Sua própria família, que começa a se incomodar com tal situação, indo logo em seguida tirar satisfações com Sam. O baque é forte. Sua própria prima? Ela não acredita, mas decide averiguar. Fica sabendo que até para o rapaz com o qual ela estava envolvida Anne contou histórias. Claro que ele não acreditou, tampouco sua família, mas era difícil entender o motivo daquilo. Pelo menos antes que Sam parasse pra pensar e analisasse todo o passado de sua relação com Anne.

Tais atitudes não cessam. Sam vai perdendo a paciência e decide começar a montar um plano para desmascarar Anne na frente de toda a sua família. Infelizmente, o carinho que sentia por ela havia se esgotado. Agora ela jogaria com apenas uma tática: olho por olho. Mas seria beneficiada por um pequeno e importantíssimo detalhe: seus argumentos eram baseados na verdade.

E quais seriam eles? Resumidamente, baseariam-se no caráter de seu namorado, David. Com atitudes que deixariam James Bond envergonhado, David nunca respeitou o namoro que tinha em mãos. Traía descaradamente Anne. Levava mulheres para sua casa, que ficava logo em frente a dela. Houve uma vez em que, ao se despedir de uma de suas amantes, ele fora surpreendido por Anne, chegando para lhe dar um abraço de bom dia e, por questão de segundos, não encontrando a outra. Sam sabia de tudo. Sabia de tudo mas nunca contou porque sempre acreditou que não se deve meter a colher em relacionamentos alheios. Mesmo que pra ela fosse difícil deixar sua prima fazer papel de trouxa por 5 anos.

O plano estava montado. No dia de seu aniversário, Sam convida Anne e David. Com uma extrema cara-de-pau, os dois aparecem, a abraçam e ficam para aproveitar a festa. Festa que seria marcada por apenas um acontecimento. Perto das 23h, Sam se levanta e chama a atenção de todos. Agradecendo a participação, ela diz que precisa falar algo importante, e que colocaria em jogo a relação de duas pessoas ali presentes. Anne sente que a frase é dirigida a ela. Com uma frieza assustadora, Sam diz:

"Sempre fomos companheiras. Acreditei que duraria pra sempre. Confiança não é algo que consigo encontrar em qualquer esquina. Em você eu encontrava. Anne, pra uma pessoa que se julga tão segura, encontrar motivos para tais atitudes que você tomou é muito difícil pra mim. Eu tentei. Tentei esperar pra ver se você se tocava, se abria os olhos. Mas não deu. Você continuou inventando coisas sobre mim e sobre grande parte dos meus amigos, tentando causar discórdia.
Eu só queria saber porque. Mas cansei de esperar você me dar essa resposta. Trouxe aqui alguns registros que comprovam que a pessoa que menos te respeitava não era eu. Peço que não abra agora. Não na frente de todos. Leve pra casa, tire suas conclusões. Não sou uma pessoa vingativa, mas dessa vez você mereceu. Cuide de você antes de cuidar da vida dos outros."

Sentindo a seriedade com que Sam dizia aquelas palavras, Anne poupa a vergonha que sabia que iria sentir e decide fazer o que ela lhe pediu. O público fica em silêncio por um bom tempo, antes de começarem a mudar o clima sério que a festa havia adquirido. É claro que o conteúdo do envelope vai cair na boca de todos daqui a alguns dias. Sam sabe disso. Mas, por enquanto, ela apenas deixa com que a festa acabe, os convidados se retirem e finalmente ela possa se deitar, tendo a certeza de que mesmo sendo algo reprovável, a vingança é um prato que pode ser comido quente, fazendo com que pessoas como Anne queimem a língua que tanto usaram em prol de um sentimento tão mesquinho como aquele que preencheu o seu coração e a sua mente.
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